Cotrijal: setor leiteiro enfrenta uma tempestade perfeita na pandemia


A reportagem integra a edição especial do Jornal Cotrijal na Expodireto Cotrijal, de março. Acesse aqui a versão completa.

A tempestade perfeita. É assim que alguns especialistas analisam a atual crise do setor lácteo brasileiro, marcada por margem de lucro menor, inflação generalizada que freia a demanda, taxa cambial desfavorável que encarece aquisição de insumos importados, preço dos grãos elevados para produção de ração e, para completar, uma dura estiagem que prejudica a oferta de pastagem e impacta na nutrição animal.

O setor lácteo viveu dois momentos distintos na pandemia de covid-19. Em 2020, o consumo cresceu devido à liberação do Auxílio Emergencial do Governo Federal, o que elevou a demanda pelas classes D e E. O isolamento social, que forçou a população a ficar em casa para se proteger do vírus, também foi benéfico, pois provocou novos hábitos de consumo, elevando a procura para derivados como iogurte, doce de leite, queijo, leite condensado, creme de leite, entre outros.

Ano passado, sem auxílio e com o retorno gradual à nova rotina, o consumo diminuiu e a inflação impediu o mercado de se manter aquecido. Porém, o aumento dos custos de produção agravou a crise.

O índice de custo de produção, calculado pela Embrapa Gado de Leite (ICPLeite) já vinha de uma elevação de 10,7% em 2020 e atingiu 30,0% em 2021, reduzindo a margem de lucro dos produtores. O que mais impactou foi a alimentação do rebanho. A produção e compra de volumosos teve um aumento de 75%, a alimentação concentrada, 26%, e o sal mineral, 53%.

Soja e milho elevam custos

O pesquisador, professor e economista Paulo do Carmo Martins, que atuou como chefe-geral da Embrapa Gado de Leite entre 2014 e 2021, analisa que o preço pago pelo consumidor não seguiu a mesma tendência dos custos. O profissional ressalta que outro fator importante para o atual cenário foi a valorização das commodities, como a soja e o milho, presentes na formulação da ração concentrada do rebanho.

“A soja e o milho ficaram muito caros e isso fez com que os custos ficassem elevados e o preço do leite não seguiu a mesma tendência. As margens ficaram muito apertadas e alguns produtores tiveram dificuldades em fechar o ano de 2021”, afirma Martins.

O gerente de Produção Animal da Cotrijal, Alan Issa Rahman, fez um cálculo que dá perfeita demonstração do tamanho do problema. “Uma vaca de alta produção está comendo em torno de 10 quilos de ração. Uma ração a R$ 1,50 o quilo, custa R$ 15,00 vaca/dia. Ano passado, trabalhamos com R$ 2,20 de média, o que significa R$ 22,00 vaca/dia mais o resto da conta: silagem, pastagem, feno... No ano de 2021, os preços continuaram firmes, porém com um aumento exacerbado dos custos de produção, sobretudo, dos custos alimentares”, explica.

Segundo análises da Embrapa Gado de Leite, custos mais elevados de produção e a redução de preços reais recebidos pelos produtores da ordem de 5% em 2021 impactaram negativamente as margens de lucro. Em 2020, o preço real líquido do leite pago ao produtor fechou o ano em R$ 2,44. Já em dezembro do ano passado, o valor ficou em R$ 2,13.

No Rio Grande do Sul, no mês passado, o preço real médio pago ao produtor foi R$ 2,21, queda de 11,2% em comparação com janeiro de 2021.

 

Estiagem provoca maior gasto com insumos

A expectativa para 2022 era de que o início do ano fosse marcado pela retomada no consumo de leite e seus derivados, com preços de produção se acomodando. Mas não foi o que aconteceu. Para piorar o cenário, a estiagem arrasou as pastagens.

“Estamos, praticamente, com o mesmo preço do leite desde novembro, mas custo de produção pior que 2021. Milho passando de R$ 95,00 o saco e a soja também com preço alto prejudicam a aquisição de farelo para ração. Os fertilizantes seguem com preço elevado”, afirma Alan Rahman.

O gerente de Produção Animal da Cotrijal lembra ainda que os produtores de leite tiveram prejuízo no campo, com custo de implantação, mas sem retorno de produção. “A seca piorou tudo. O investimento que o produtor fez em um hectare de milho, que era para produzir 60 toneladas, gerou entre 15 e 20 toneladas. E tem que somar também o insumo aplicado, fertilizante e a semente de qualidade que foi colocada na terra”, destaca Rahman.


Cadeia produtiva

O engenheiro agrônomo e supervisor da Cooperativa Central Gaúcha Ltda (CCGL), Luis Otávio da Costa de Lima, comenta que a falta de pastagens de qualidade impacta diretamente na cadeia produtiva.

“Tivemos duas secas importantes nos dois últimos anos, o que demanda um uso maior de insumos dentro da atividade. O produtor acaba tendo que aportar mais alimentos para os animais em razão de ter uma oferta de pastagem menor”, relata Lima.

Conforme o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea-Esalq/USP), os adubos e corretivos valorizaram 79,85% em 2021, seguidos pelos suplementos minerais, com alta de 32,37% no ano.

Fonte: Assessoria de Imprensa e Marketing da Cotrijal